Eu estava nua andando pela cidade, passei pelo barzinho do seu Wilson e disse um sorridente e costumeiro olá e ele me olhou normalmente dizendo: “tudo bem, Ná?” “Tudo em cima, Seu Wilson! Como vai a Dona Vanda?” disse. “Tudo em paz com ela, minha flor.” Sorri e continuei minha caminhada nua. Percebam que eu disse caminha nua e não nua caminha, portanto, não achem que toda essa nudez está no sentido metafórico. Longe de mim estavam as metáforas, mas... metaforizando, estava nua de tudo mesmo. 'Nuíssima'. Erradamente nua, mas era certo. Explicarei o porquê.
Minha nudez estava certíssima, não porque todos ao meu redor estavam nus, mas, sim, porque todos olhavam-me como se nada de errado estivesse fazendo. Não era bem uma coisa certa, nem normal – pois norma certamente não seguia, já que todos estavam vestidos –, porém em momento algum as pessoas ligavam para minha nudez e não era por estarem todos muito ocupadas, afinal sempre há aquelas pessoas que por ausência de vida, preocupam-se com a alheia, respiram o ar alheio, ouvem os sons destinados a outros ouvidos.... Enfim, até aqueles que estão aí para tudo, não estavam aí para mim.
Ai, mas quão tranquila estava eu a caminhar, disse oi para Dona Expeditina, que colocava um bolo na janela para esfriar... e ela me disse: "É de fubá, Ná, seu preferido, depois vem cá pegar um pedaço! Sim, o Pedrinho mandou perguntar se você está livre no domingo à tarde pra ensinar pra ele português, tadinho, tá com nota baixa na matéria. Respodi: “Sim, estou livre, venho à tarde ensinar a ele.” “Obrigada, Ná, não se esqueça do bolo, viu, venha antes que acabe.” “E eu lá vou esquecer de comida, Dona Expeditina!”
Continuei meu passeio pela minha cidade, falando com os meus conhecidos, passando por lojas... Continuei e ninguém se importava com minha nudez. Ninguém. Ah... Nem eu me importava, era para mim muito normal não estar vestida.
Acordei, era sonho é claro, vocês já deveriam ter previsto. Mas que sonho estranho esse, minha nudez não era metafórica, estava nua mesmo e não se importavam com isso... Tinha que ser sonho mesmo... quando é que vão deixar de se importar com os outros? Neste mundo, sobrevivência é uma questão de imitação. Quem não segue a norma, normal não é.
No sonho, pelo menos, não fui para o hospício.